Por Que Seu Cérebro Apaga Sua Infância
A ciência explica por que você não lembra de quase nada antes dos 4 anos. Descubra como a amnésia infantil é um presente evolutivo e o que isso revela sobre seu cérebro hoje.
ATUALIDADES


POR QUE SEU CÉREBRO APAGA SUA INFÂNCIA
Por: Robson M Silva
14/05/2025 ás 12:00h
Lembra quando você era bebê? Claro que não – e isso é exatamente o ponto. Se você já se perguntou por que não consegue se lembrar daquele chá de fraldas épico ou do seu primeiro passo, a neurociência tem respostas fascinantes.
Acontece que seu cérebro infantil foi projetado para esquecer quase tudo antes dos 4 anos, num fenômeno chamado amnésia infantil. Mas não é um bug – é um recurso evolutivo brilhante. Imagine seu cérebro como um celular novinho: nos primeiros anos, ele faz tantos downloads (aprendizados) que precisa deletar arquivos temporários (memórias) para não travar. O resultado? Você esquece 99% da infância, mas ganha espaço para coisas realmente úteis – como não queimar a mão no fogão duas vezes.
A ciência explica por que você não lembra de quase nada antes dos 4 anos. Descubra como a amnésia infantil é um presente evolutivo e o que isso revela sobre seu cérebro hoje.
A PODA NEURAL: O GRANDE DELETADOR DE MEMÓRIAS
Você não lembra do seu primeiro aniversário, do cheiro do leite materno ou da primeira vez que andou. Não é falha da sua memória — é um plano do seu cérebro. A amnésia infantil, que apaga quase tudo antes dos 4 anos, é um truque evolutivo para que você não fique preso a um passado irrelevante. E sim, isso diz muito sobre como você funciona hoje.
Seu cérebro infantil é como um celular em modo de economia de energia: ele prioriza espaço para o essencial e deleta o resto. Nos primeiros anos de vida, você forma trilhões de conexões neuronais — muitas delas aleatórias ou desnecessárias. Entre os 2 e 7 anos, um processo chamado poda neural entra em ação, apagando até 40% dessas ligações. Estudos da Universidade de Toronto revelam que essa "faxina" é crucial para otimizar o aprendizado de habilidades complexas, como linguagem e sociabilidade (Josselyn & Frankland, 2012).
Mas não é só uma questão de espaço. Antes dos 4 anos, seu cérebro ainda não tem ferramentas para transformar experiências em memórias duradouras. O hipocampo, responsável por arquivar lembranças, só atinge maturidade funcional por volta dos 4 anos — como mostraram imagens de ressonância em crianças (University of Minnesota, 2018). Imagine tentar salvar um filme sem um cartão de memória: as cenas até existem, mas se perdem no vazio.
Por fim, há um motivo evolutivo cruelmente prático: esquecer protege você. Se guardasse cada birra, medo ou frustração da infância, sua mente adulta entraria em colapso. É como se seu cérebro dissesse: "Você vai precisar andar de bicicleta, mas não precisa lembrar das 50 vezes que caiu." O esquecimento, aqui, não é um defeito — é um ato de gentileza biológica.
EMOÇÕES FRACAS = MEMÓRIAS FRÁGEIS


imagem feita por IA
Antes dos 4 anos, seu cérebro não sabe o que fazer com emoções intensas. Uma queda, um susto ou até uma alegria explosiva são vividos com toda a força no momento, mas não viram memórias sólidas. A razão é simples: a região que processa emoções (a amígdala) e a que armazena lembranças (o hipocampo) ainda não conversam direito. É como assistir a um filme sem som — você sente a tensão, mas não entende o enredo.
Isso explica por que muitos adultos têm apenas "fragmentos" da infância: um cheiro de talco, uma música de ninar ou a textura de um cobertor. Esses detalhes sensoriais ficam armazenados em áreas primitivas do cérebro, enquanto a narrativa se perde. E mesmo eventos traumáticos, como uma queda grave ou uma internação hospitalar, raramente viram memórias vívidas. Seu cérebro infantil registra o medo no corpo (suor, taquicardia), mas não na mente consciente.
A ironia? Quando adultos, projetamos emoções atuais em memórias que nem existem. Você pode odiar abacaxi sem saber que, aos 2 anos, cuspiu o primeiro pedaço e sua mãe riu até chorar. Seu cérebro apagou a cena, mas o "trauma" ficou como um alerta inconsciente. É como ter um aplicativo rodando em segundo plano sem saber porquê.
O LADO BOM DE ESQUECER
Esquecer a infância não é uma falha — é um superpoder disfarçado. Seu cérebro apagou as memórias inúteis para você ter espaço mental para coisas como aprender álgebra, criar laços afetivos e dominar a arte de fingir que gosta de reunião no Zoom. Imagine carregar o peso de cada vergonha, medo ou frustração dos primeiros anos: você seria um adulto paralisado, revivendo traumas de um tempo em que nem sabia amarrar os sapatos.
A neurociência chama isso de plasticidade adaptativa. Ao deletar o passado, seu cérebro mantém a mente flexível para se reinventar. É por isso que crianças adotadas após os 5 anos, por exemplo, geralmente preservam memórias do abrigo — seu cérebro já tinha ferramentas para guardá-las. Já as adotadas antes disso raramente lembram, o que facilita a adaptação à nova família. Esquecer, aqui, é um ato de reinvenção.
E há um bônus evolutivo: sem memórias detalhadas da infância, você não fica comparando sua vida adulta a um "paraíso perdido". Ninguém sente saudade de ser um bebê indefeso, mesmo que, na época, tudo parecesse mais simples. Seu cérebro protegeu você da nostalgia tóxica — e permitiu que construísse uma identidade sem amarras ao passado.
CONCLUSÃO
Seu cérebro apagou sua infância não porque ela não importa, mas porque você importa mais. A amnésia infantil é um presente da evolução: ela apaga quedas, choros e birras para que você tenha espaço para ser quem é hoje. As poucas memórias que restaram — um cheiro, uma canção, um lugar — não são falhas do sistema. São lembretes de que, mesmo sem recordações completas, sua história começou muito antes de você poder contá-la.
Referencia:
Por que esquecemos memórias da infância? Ciência t... | VEJA
Os bebês fazem memórias - então por que não podemos nos lembrar de nossos primeiros anos?
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Ah, e se alguém jurar que lembra de quando era bebê, mostre a ciência: o cérebro mente, mas os neurônios não!"